Fragmentos de Tempo
Ficcionar é tornar o mundo artisticamente aceitável
Janeiro 22, 2007 por José Roldão
Distraio ao som do móbile de bambú cantando ao vento que lhe acode. Disparo idéias sem fim, pois que nada alcançam, para logo em seguida esquecer na impessoalidade aquele dom que distancia. Divago.
Em que tempo se passa a literatura? Segundo Jorge Luis Borges, a literatura acontece quando o leitor participa, ou seja, quando ele abre o livro. Antes, era apenas um amontoado de folhas encadernadas, com alguma imagem que deveria ser interessante: uma isca.
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Se formos adotar a teoria de Borges, deveríamos crer, então, que o tempo seria algo pessoal, pois se a literatura acontece em dependência do leitor, sem este nada aconteceria. De certa forma, um livro fechado e sozinho sobre uma mesa nada significa. Porém o escritor – que escreve e lê o que ele mesmo escreveu – participa desse tempo, mesmo que em princípio. Tendo isto em vista, lembremos ainda uma idéia exposta pelo mesmo autor de que o universo seria um único e imenso livro. Não é de admirar essa afirmativa, ainda mais se a tomarmos embutida nesse mesmo universo. Sim, pois se o tempo da literatura acontece quando o leitor abre o livro, também poderemos propor que, na verdade, o que existe são pausas de leitura, pausas nesse literatura quando não acessada. A cada novo acesso, a cada vez que aquele livro sobre a mesa é aberto, na verdade o que pegamos são fragmentos de tempo.
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O leitor acessa essa máquina do tempo – um tempo que participa do impessoal e pessoal simultaneamente – e atravessa fronteiras montado no cavalo veloz da imaginação criativa. O leitor adapta o livro, o encaixa em seu próprio tempo. E quando isso acontece ele pode dizer que o livro é bom, pois o livro e o leitor passam a ser um só, ocupando o mesmo espaço (imaginação) e o mesmo tempo (co-criação). E a literatura acontece, plenamente.
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